Importa-se de repetir? #1
"Herdeira da linhagem a que pertencem cantoras como Billie Holiday ou Nina Simone, capazes de exporem um misto de gravidade emocional e vulnerabilidade extrema, é fácil ser moralista com Amy Winehouse. É alguém que se movimenta, quase sempre, no fio da navalha do risível, alimentando as paixões mais desencontradas. Que ela tem demónios, fantasmas e muitos problemas, é por demais evidente. Mas o mais interessante, no seu caso, como no de celebridades semelhantes, é por vezes virar o espelho reflector para o lado de cá, para percebermos quais são os nossos demónios e fantasmas. No final do concerto era perceptível que havia no ar um misto de sensações difíceis de descrever. Mas todos emitiam juízos definitivos. Uns comentavam que sabiam que ela tinha problemas de alcoolismo, mas nunca haviam pensado que seria assim e sentiam-se defraudados. Mas também havia quem achasse que a sua performance desajeitada fazia parte do seu charme. Ao meu lado, alguém dizia que se pudesse a levava para casa, para lhe fazer festas, apelando ao sentido de protecção. A sua vida tornou-se, aos nossos olhos, um livro aberto. Todos projectamos fantasias nela. Todos temos algo a dizer sobre o seu futuro. Vai-se safar. Não se vai safar. Gostamos de destinos traçados. Tragédias. No seu caso, parece evidente, que é alguém que não joga bem ao jogo da fama. As fronteiras entre o que é a exposição pessoal, da sua vida, e a exposição artística, pública, não são nítidas. Por um lado, porque ela própria parece não saber distinguir essas extremidades. Quem já a viu ao vivo, antes de todos os alvoroços, percebe-o. Mas também porque o bordel mediático à sua volta é de tal forma incessante, que deverá ser difícil escapar-lhe. Jon Pareles, crítico de música do New York Times, escrevia no princípio do ano passado - antes portanto dos escândalos terem começado - depois de a ter entrevistado, que sentia que tinha estado perante alguém acossada, que poderia soçobrar perante o ambiente competitivo da indústria do entretenimento. Acossada talvez seja uma das palavras para descrever a Amy Winehouse da noite de sexta no Rock in Rio. Mas cada um terá a sua. Frágil, magnífica, autêntica, verdadeira, descontrolada, decadente, fraude ou trágica, foram algumas das que mais se ouviram, para tentar descrever uma personalidade complexa contra todos os simplismos onde tendemos a enclausurá-la."
>> Victor Belanciano in Público (P2, 1/6/08, pps. 8 e 9)
>> Victor Belanciano in Público (P2, 1/6/08, pps. 8 e 9)
1 comentário:
Eu vi o texto no domingo no Público. Achei grande as palavras do Belanciano. Qto ao post da madonna, nem sabia do segundo single, e a única grande canção do disco para mim é a primeira «Candy Shop»
Abraços.
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