quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Quanto vale um mp3?

Vale a pena ler e pensar sobre o texto publicado por Trent Reznor, líder dos Nine Inch Nails, no sítio da sua banda sobre "The Inevitable Rise And Liberation of Niggystardust!", de Saul Williams, álbum produzido sob a sua rédea curta e que é mais uma acha lançada para a cada vez maior fogueira que põe em causa o actual sistema de distribuição discográfica. Com evidente inspiração no "método Radiohead" (apesar de diferenças fundamentais), Reznor e Saul decidiram colocar o álbum disponível num ficheiro zipado no site do cantor, com duas opções de dowload: uma versão grátis, de menor qualidade (ainda que aceitável: 192kpbs) e uma outra, com opções de download de qualidade bastante superior, pelo preço de 5$. Nos primeiros três meses, 154.449 pessoas fizeram o dowload do ficheiro, sendo que, dessas, apenas 18,3% (28.322) pagaram 5$ por ele. Para Trent Reznor, que invoca também custos e despesas pessoais da produção do álbum e da sua distribuição online, estes dados são, no mínimo, desanimadores. Note-se, por exemplo, que Saul Williams, com o seu último álbum, lançado em 2004 numa editora tradicional, vendeu apenas pouco mais do que 30.000 cópias - o que significa que, devido aos preços praticados no mercado, acabou por lucrar mais nessa altura. Contudo, a desilusão de Trent face a estes números deve ser analisada com cautela, uma vez que as estatísticas, como sempre, escondem determinados factos, o que pode levar a uma interpretação errada da informação. Alguns pontos que me parecem importantes na análise dos dados, sobretudo no que diz respeito à percentagem dos que compraram o álbum:

1) Há um pormenor neste caso que muda muita coisa: é que o álbum é apenas disponibilizado através da internet, não havendo venda física do mesmo. E a ideia de que o mp3 é um substituto perfeito do CD é errada. Entre as muitas razões que leverão alguém a despender dinheiro para a música está, com certeza, a troca de liquidez por um bem material (associada a uma maior realização pessoal do que o cenário em que a nossa "moeda de troca" é um ficheiro virtual).

2) A resposta à questão "quanto vale um mp3?" é universalmente variável e, portanto, os 5$, ainda que pareça um valor razoável, poderá ser um preço baixo para uns e elevado para outros - sobretudo quando colocada a hipótese dos 0$.

3) O conceito de Reznor de que "a coisa certa a fazer" é, mediante uma audição grátis do álbum e consequente reconhecimento de "qualidade", o consumidor apoiar e suportar os direitos do artista comprando a versão paga do álbum a um determinado preço é, desde logo, falível. Esse será apenas um cenário (entre vários outros) altamente pessoal e, sobretudo, discutível.

4) As 154.449 pessoas que fizeram os 2 tipos de download podem não ser (não são, com certeza) 154.449 interessados no trabalho de Saul. Entre estes, encontram-se, entre outros, fãs dos Nine Inch Nails, mas também meros ouvintes curiosos e desinteressados que nada sabem sobre o artista, ou ainda aqueles que descarregam música para "encher iPods".

5) Os dados escondem o "porquê" da compra e, portanto, algumas condicionantes como a menoridade, a falta de confiança no uso do cartão de crédito pela net ou as dificuldades e ignorâncias quanto ao modo de pagamento não estão expressas na percentagem dos que adquiriram o ficheiro.

6) A opinião sobre um álbum é algo de subjectivo e plural. No entanto, admitindo uma divisão simplista dos ouvintes entre os que "gostaram" e "não gostaram", a percentagem dos segundos permanece uma incógnita, o que terá a sua repercursão nos downloads pagos (admitindo que, regral geral, quem não gostar do álbum, não o compra)

Não significa isto, entenda-se, que esta não seja uma iniciativa interessante e a ter em conta:

* Significa que a interpretação simplista dos resultados pode ser enganadora;

* Significa que há vários modelos possíveis e que não há métodos perfeitos e universais;

* Significa que é preciso aperfeiçoar e repensar estes novos conceitos de distribuição discográfica.

* Significa, sobretudo, que há ainda um longo caminho a percorrer até que a indústria discográfica perceba e reconheça, de uma vez por todas, que o actual sistema de compra e venda de música (aos preços de mercado praticados actualmente) está mais do que ultrapassado.

1 comentário:

Shumway disse...

Um tema para reflectir.
As possiveis opiniões devem ser variadas e nada consensuais.

Abraço